segunda-feira, 30 de setembro de 2019

CENTELHAS EUCARÍSTICAS: Esperando a Graça

CENTELHAS EUCARÍSTICAS
 PEQUENA COLEÇÃO
DE
Pensamentos e afetos devotos
a
JESUS SACRAMENTADO

XXIII
Esperando a graça
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DERRAMEI todo o meu coração perante ti, ó Jesus! Chorei a minha dor, cantei as minhas esperanças, desafoguei todo o meu amor; pedi-te, exorei-te... Agora sinto-me extenuada... Mas, não saio daqui, sem me fazeres a graça implorada.

Orei com toda a confiança nos méritos da tua Paixão e Morte; apresentei à tua misericórdia as tuas próprias dores; recordei-te o teubatei, procurai, pedi... Mas até agora não obtive coisa alguma... Contudo, não me quero ir embora, e fico aqui esperando a graça.

Para valorizar a minha oração e as minhas esperanças recomendei-me a certas almas que te são muito caras, pedi-lhes que intercedessem por mim; e parece-me que essas almas, estando mais familiarizadas com o teu Coração, mais tarde ou mais cedo deverão ser ouvidas. E há já tanto tempo que elas oram, mas a graça não se mostra ainda... E eu aqui estou esperando.

É possível que somente eu esteja excluída do banquete dos teus favores? Muitos que oraram menos que eu e talvez com esperança menos que a minha, foram ouvidos, e muitas vezes os ouvi contar a história das dores passadas e das consolações presentes... E eu terei de estar aqui com as mãos sempre vazias! Ó meu bom Jesus, e até quando?

Às vezes o coração dá-me um salto, e parece dizer-me: alegra-te! A graça está feita! Então eu mando um suspiro de alegria, sorrio, abro aboca para dizer um obrigada... Mas o agradecimento fica sufocado por um gemido... Pobre de mim! Era uma ilusão!

O descontentamento sugere-me pôr de parte a oração; e como é tremenda esta tentação!... Então procuro dentro do coração e nos mais íntimos recônditos da alma alguma invocação... Alguma jaculatória... Um grito... Alguma coisa que saiba a oração, e depois torno a falar-te, ó Jesus... Mas quem fala são os olhos com as últimas lágrimas, é o coração escalando os suspiros mais arrastados... E depois torno a calar-me, triste... Esperando... Sempre esperando...

Recorro a Maria, recorro aos meus santos padroeiros, recorro às almas do Purgatório e a outras almas que creio estarem já no Paraíso, conto-lhes aquilo que sofro, aquilo que espero... Mas, depois, pensando que o primeiro e o mais poderoso medianeiro junto de Deus és tu mesmo, concentro toda a minha alma na tua Hóstia, ó Jesus, como que para lutar coração a coração contigo, e constranger-te a ouvir-me... E, depois, quando não posso mais, faço silêncio, inclino a fronte, deixo cair os braços, e espero...

Mas por que preço me concederás esta graça, ó Jesus? Di-me-lo; que condições exiges para ouvir-me? Queres de mim mortificações? Fá-las-ei! Queres que eu seja um pouco mais paciente? Sê-lo-ei! Queres que eu seja boa e caritativa com aquela pessoa antipática? Farei o possível por sê-lo! Queres de mim um certo sacrifício... Aquele sacrifício que me custa tanto? Pois bem, com o teu auxílio, farei esse sacrifício! Mas, meu caro Jesus, bem vês que eu não sou boa para nada! E quererás ouvir-me por um preço superior às minhas forças? Basta: eu não sei o que exiges para ouvir-me; sei somente isto: que tu podes tudo, que eu preciso de tudo, e... Estou aqui esperando.

Mas é possível que o Tabernáculo, que foi sempre o refúgio das minhas dores e o santuário das minhas esperanças, se torne agora o albergue dos meus desenganos? É possível que quando vir um povo devoto inclinar-se diante da Hóstia, adorá-la, escorá-la, render-lhe graças, eu me veja constrangida a dizer que para os outros há sempre alguma graça, e para mim não há nada? Que quando fizer a comunhão a tristeza me constrinja a dizer que já não sei que pedir ao meu Jesus, porque me diz sempre que não? Ó Jesus, vê para onde me leva a minha pobre cabeça! Quase, quase, em vez de orar, dizia blasfêmias...

Jesus! Jesus! Não vês que eu estou aqui? Não vês quanto eu sofro? Não vês que me obstino em receber aquela graça? Não vês que esgotei todas as forças em orar e esperar? Ó Jesus, eu não saio daqui enquanto não for ouvida... Aquilo que podia fazer, já o fiz... Outra coisa não sei fazer, senão esperar.,. Ó Jesus! Agora é contigo.

domingo, 29 de setembro de 2019

CENTELHAS EUCARÍSTICAS: Jesus!... Jesus!...

CENTELHAS EUCARÍSTICAS
 PEQUENA COLEÇÃO
DE
Pensamentos e afetos devotos
a
JESUS SACRAMENTADO


XXII
Jesus!... Jesus!... 
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EIS a oração que eu te farei tantas e tantas vezes, ó meu amável Jesus. O teu nome adorável será a súmula de todas as minhas aspirações, será o grito angustioso do meu coração dilacerado, e te recordará todas as minhas dores e todas as minhas esperanças. Na hora do pranto tu me verás genuflexa diante do altar com o olhar fixo na Hóstia, com os lábios incapazes de pronunciar outra palavra, fora do teu nome — Jesus!... 

E quando me ouvires pronunciar este nome te volverás para mim, como que chamado pela voz do amor, e me sorrirás, como sabes sorrir quando amas. Jesus!... E tu compreenderás que a tristeza sopra impetuosa dentro da minha alma, sufocando-me todos os gritos, menos este, que é o mais potente do coração humano, o mais resistente ao ímpeto do desconforto e da desesperação. Jesus!... E bem compreenderás que a terra me recusa todo o conforto e que em ti somente repousa a minha esperança vacilante. Jesus!... E tu compreenderás que a cruz me esmaga com o seu peso imane, e que só tu me podes dar a força de arrastá-la com dignidade cristã. Jesus!... E tu compreenderás que a vida me pesa e a morte me aterroriza, que a responsabilidade do meu passado e a prestação das contas no futuro me flagelam o coração com toda a amargura do arrependimento e o temor de uma terrível condenação. Jesus!... E tu compreenderás o esforço incessante do meu espírito para estar volvido para o Paraíso, única morada onde espero amar bem, amar incessantemente, amar para sempre. Jesus!... E este nome quererá dizer toda a história duma alma que tu amaste até morrer por ela, e que agora sente a necessidade de amar-te até morrer por ti, história que ela desejaria contar diante do Tabernáculo, para glorificar a tua misericórdia e as grandezas inefáveis da tua graça. Jesus!... E este grito, repetido ao longo das horas do meu sofrer, durante as noites insones passadas entre lágrimas secretas e misteriosas angústias, nos dias de incomputáveis fadigas, nos poucos instantes de repouso, dir-te-á que esta pobre alma, nutrida de desventura, não te quer abandonar jamais, e preferirá sempre morrer mártir ao pé da Hóstia, a viver em meio dos triunfos e alegrias mundanas, longe de ti. Jesus!... E tu compreenderás que esta quero que seja a minha última palavra ao exalar o último suspiro... E tu virás ao meu encontro e responderás finalmente: Chamaste-me, filha, eis me aqui...Não é verdade, ó Jesus, que tu virás ao meu encontro, me dirás aquela palavra?

sábado, 28 de setembro de 2019

CENTELHAS EUCARÍSTICAS: Fogos de Palha

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JESUS SACRAMENTADO

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XXI
Fogos de palha
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 SE dissesse que tenho sempre tratado bem a Jesus, com delicadeza, com verdadeiro amor filial, diria uma mentira. Tenho começado muitas vezes, mas não tenho prosseguido, e o edifício da minha piedade cristã está agora como estava há muitos anos!

Recordo-me de que, quando menina, sentia uma grande vontade de dar-me toda a Jesus, mas senti-me também dominada por uma grande vaidade e inconstância; assim me tenho arrastado até hoje, alternando práticas de devoção com atos de preguiça e langor espiritual.

Posso até dizer que experimentei todas as devoções. leitura dum livro, a audição duma predica, o conhecimento duma alma devota, a assistência a uma função especial de qualquer congregação, bastava para me prometer a mim mesma e a Deus que recitaria todos os dias um determinado número de Padres Nossos Ave-Marias, que faria de vez em quando uma Via Sacra, que recitaria qualquer coroazinha, que me inscreveria em qualquer confraria; e para isso me ia enriquecendo pouco a pouco de livros de piedade, punha ao pescoço, um após outro, vários escapulários, trazia ao peito medalhas de diversos motivos, assistia afunções particulares em igrejas determinadas, frequentava conferências mensais e semanais... Como, porém, muitas vezes me acontecia não poder atender simultaneamente a tantos compromissos tomados, pouco a pouco os ia esquecendo um após outro até que, vendo-os já todos abandonados, me refazia desde o princípio com novas resoluções e empenhos sinceros, começando para depois abandonar, e depois tornar a começar... Resultava daí que, um mês, dedicava-me toda às Almas do Purgatório; depois, deixava as almas purgantes, e toda me dedicava ao Anjo da Guarda; depois era para a conversão dos pecadores; mais tarde voltava-me para São José; depois para um outro Santo; depois para Maria Santíssima, ora sob um título, ora sob outro; e assim por diante, uma série de belíssimas devoções. De princípio parecia que cada devoção havia de durar toda a vida, mas, depois de um ou dois meses, deixava-a apagar, para dar lugar a uma outra; e assim cheguei a experimentar muitas devoções, mas não perseverei em nenhuma... Entretanto, os anos passaram, e eu... Encontro-me aqui de mãos vazias. Andei volitando de flor em flor, mas pouco mel colhi; acalentei-me a fogos de palha, bastantes para não me deixarem gelar, mas que não conseguiram inflamar-me.

Jesus via tudo e compadecia-se de mim. Certamente, Ele preferiria ver-me firme e constante em uma só devoção, a ver-me esvoaçar sobre um cento delas, porque assim eu teria hoje uma piedade um pouco mais séria e mais sólida do que a que tenho.

Fazendo um sério exame de consciência, uma verdade ressalta límpida e inegável: e é que, Jesus Sacramentado, embora fosse para mim uma grande coisa, não era contudo o pensamento que dominava a minha mente, e muito menos o afeto que dominava o meu coração. As Comunhões e a Missa entravam em todas as funções a que assistia, mas não eram para mim a parte principal...

Percebo agora, sem fazer mais indagações, a razão por que as minhas devoções se evolaram como o fumo: é porque não estavam ligadas ao meu coração pelo amor a Jesus Sacramentado... E quando falta Jesus, falta a pedra fundamental de todo o edifício, e o que não se recolhe com Jesus, desperdiça-se.

Quantas riquezas teria agora acumuladas, se tivesse possuído a arte de começar por Jesus todos os meus atos e referi-los a Ele! Pois bem, contarei mais esta desgraça entre tantas da minha vida, e aprenderei do passado como regular-me no futuro.

Façamos, pois, um pacto, ó Jesus. Eu te prometo não empreender mais nenhuma prática de piedade, sem invocar primeiro lume da tua graça e a bênção do teu coração; prometo empenhar-me em compreender que toda a boa obra, pequena ou grande que seja, parte de ti e deve voltar para ti; prometo fazer todo e qualquer ato de devoção na presença do Tabernáculo, ou ao menos com a mente e coração fixos em ti, quando me encontre fora da igreja. E tu, da tua parte, concedes-me um generoso perdão sobre todas as friezas e indiferenças passadas, e faze-me a graça de trazer o teu fogo, aquele fogo inextinguível, que substitua as tênues chamas do meu fogo de palha.

sexta-feira, 27 de setembro de 2019

CENTELHAS EUCARÍSTICAS: Pelos Sacerdotes Defuntos

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JESUS SACRAMENTADO
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XX
Pelos sacerdotes defuntos
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ACOLHE, ó Jesus, a oração que se eleva do meu coração ao trono da tua misericórdia. É uma oração toda impregnada de amor, de piedade, de veneração.. Ó Jesus, eu te peço pelos teus sacerdotes defuntos! — Recorda, ó grande Deus, quanto trabalharam por ti neste mesmo templo, junto deste mesmo altar, no tribunal da penitência, no púlpito, com a voz, com o exemplo, e talvez entre prantos e dores. 

Quantas almas extraviadas reconduziram arrependidas aos teus pés! Quantas almas inocentes não salvaram! Quanta ignorância não dissiparam das almas cristãs! Quantas consolações não souberam derramar sobre corações ulcerados pelo infortúnio ou gementes sob o peso de uma cruz, tão semelhante à tua! E agora, depois de terem concluído a sua missão sacerdotal, depois de terem consumado por ti o último fio de vida, será possível que devam ainda gemer entre as chamas expiadoras do Purgatório? Tu és bom... Mas és também justo! Os teus rigores para com os Sacerdotes são medidos pela grandeza a que os devaste e pela dignidade sublime do seu caráter sagrado... Oh! Quantos que eu vi labutar por longos anos dentro deste templo, que vi subir a este mesmo altar, quantos cujo nome recordo e dos quais conservo na fantasia viva e falante a figura veneranda e grave... Quantos... Agora estão lá a sofrer, por terem exercitado menos santamente o seu angélico ministério! E como poucos se recordam deles! Quão poucos oram por aquelas pobres almas! Ah! Se ingratidão e o esquecimento pesam como chumbo sobre tantas almas trespassadas, sobre a dos sacerdotes defuntos o peso é imensamente maior e mais cruel. Pobres sacerdotes! Eles oraram sempre pelos mortos, todos os dias, em todas as missas... e porque são tão esquecidos agora que tanto necessitam de orações e sufrágios! Ó Jesus, tu que tanto os amaste, que os privilegiaste com a tua graça, que os fizeste depositários do teu Sangue e das tuas misericórdias, tu... tem piedade das suas almas! Ó Jesus, aquele Sangue adorado, que desce a todo o instante nos cálices sacerdotais, derrame-se em torrente de purificação e corra pelos cárceres daquelas pobres almas, embeleze-as de uma graça nova, cancele-lhes toda a responsabilidade e débito de pena, revista-as de uma estola branca que as faça novamente belas ao olhar puríssimo da tua justiça e do teu amor... Com todo o teu Sangue quantas almas não ganharam eles ao teu Coração! É possível que não reste uma só gota para resgatar as suas almas e mandá-las ao Paraíso para cantar eternamente o teu amor?

Os sacerdotes defuntos! Porque deixá-los ainda no Purgatório, ó caro Jesus? Não sofreram eles bastante sobre a terra? Recorda, ó Deus piedoso, os sacrifícios feitos para se dedicarem ao serviço do teu altar; recorda as lutas travadas com a sua constância para se libertarem do mundo e talvez de uma família amante e ternamente amada; recorda o que trabalharam e sofreram no santo tribunal da penitência... Estar ali dentro fechados longas horas, consumando lenta, mas inexoravelmente, as forças... E, contudo, para ganharem alguma alma resistiram à fadiga e depauperaram a saúde. Recorda o que eles fizeram para preservar da descrença e da corrupção a infância e a juventude... Recorda as vigílias passadas junto dos enfermos e dos moribundos... Recorda os Requiementoados sobre os cadáveres e peles almas dos nossos caros mortos... Recorda quantas vezes, perante a dor inconsolável dos sobreviventes, dos órfãos, das viúvas, eles com as mãos trementes e súplices, com os olhos cheios de lágrimas de emoção, apontaram para o céu, dizendo àquelas almas tristes — confortai-vos! Os vossos mortos vós os vereis de novo lá em cima... — E aquele céu mostrado à esperança dos fiéis, permanecerá fechado à esperança dos sacerdotes defuntos?

Recorda como foram maltratados pela ingratidão e malvadez humana, e como o mundo os cobriu de vitupério e de lama, só porque se mostravam fiéis ao teu amor e às almas que tu resgataste. Oh! Como foi amargurado o seu ministério santo! Eles oravam, e recebiam imprecações:eles amavam, e eram odiados; eles beneficiavam, e eram espoliados; eles defendiam o fraco, e eram oprimidos pelo forte; eles repartiam com o pobre o seu escasso pão, e outros embebiam em fel o bocado que restavaà sua fome; eles afadigavam-se para dar às almas a vida, e o mundo perseguia-os com o grito de morte... E todos estes tormentos não bastaram para purificá-los de toda a culpa, antes de morrerem? Ó Jesus, Tu que sentias tanta pena pelos desventurados, Tu que tantas vezes empregaste a omnipotência divina para aliviar os padecentes... Ó Jesus, pensa nos teus sacerdotes defuntos amargurados no Purgatório de dores inefáveis, tem piedade daquelas almas angustiadas... Eles foram um dia senhores de toda a Tua pessoa — Corpo, Sangue, Alma, Divindade —,... e agora não são senhores de nada?... Nem mesmo duma Tua palavra de perdão?

Eu te ofereço, ó Jesus, por aquelas almas benditas, a tua mesma Paixão e Morte. Ofereço-te o teu Sangue, ofereço-te aquela Hóstia irradiante entre as luzes do altar e sepultada entre as trevas do Tabernáculo. Ofereço-te ainda as minhas pobres orações, as Missas que ouço, as comunhões que faço, as minhas mortificações voluntárias, as penitências com que me aflige a tua mão de juiz e de pai. De um modo especial ofereço-te os meus poucos merecimentos, as minhas pobres orações, unidas às orações da Igreja Católica, pelas almas daqueles sacerdotes, que foram os verdadeiros benfeitores da minha alma e do meu coração. Miserere — tem piedade, ó bom Jesus, daquele sacerdote que derramou sobre a minha fronte a água batismal, daquele que me ensinou as primeiras verdades da fé, que pela primeira vez me fez pronunciar o teu santo nome e me falou do teu amor. Miserere— tem piedade daquele sacerdote que foi o primeiro confidente da minha consciência; daquele que me preparou para a primeira comunhão; daquele que me guiou a minha juventude pelo caminho da virtude e do bem. Miserere — tem piedade daquele sacerdote que assistiu aos meus parentes na hora tremenda da agonia e da morte e levou uma palavra de conforto e de esperança à minha família ferida pela desventura. Miserere— tem piedade daquele sacerdote que eu contristei mais de uma vez com as minhas repugnâncias à virtude e com a minha revolta aos seus conselhos paternais. Miserere— tem piedade de todos aqueles a quem prometi orações de sufrágio e que, depois do trespasse, indignamente esqueci. Ó Jesus, caro Jesus, tu que me lês no coração e na consciência, tu sabes quais são os meus deveres e quais os meus desejos; sabes por quem devo e por quem quero orar. Do trono eucarístico da tua misericórdia acolhe piedoso a voz enternecida da minha piedade, ouve a minha afetuosa oração, e chama depressa, a formarem-te uma coroa no Paraíso, as almas daqueles sacerdotes, que um dia chamaste a formarem-te uma coroa junto dos Tabernáculos santos.

quinta-feira, 26 de setembro de 2019

CENTELHAS EUCARÍSTICAS: Dentro em breve

CENTELHAS EUCARÍSTICAS
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JESUS SACRAMENTADO



XIX
Dentro em breve
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PARECE, realmente, que eu tenho encontrado o modo de amargurar todas as minhas alegrias, ainda as mais legítimas e santas. Poderia gozar em paz horas tranquilas, dias inteiros mesmo; e, afinal, vou-me angustiando com temores verdadeiramente estranhos.

Porque, dentro em breve, por estes dias próximos, terei de executar um certo trabalho que me repugna; porque terei hoje mesmo de suportar uma fadiga algum tanto grave, de superar uma dificuldade insólita, de fazer um certo sacrifício — eis que já perco a paz do coração! Imagino que me virá cair sobre os ombros um peso enorme que me esmague, e com a fantasia avolumo as coisas por forma a fazer de um grão de areia uma grande montanha. Vejo-me desde já empenhada em uma luta superior às minhas forças, constrangida a suportar um peso imane, condenada a uma imolação injusta: e tudo isto com uma certa persuasão de que sou uma vítima inocente... E, no entanto, foge-me a paz do espírito, o coração vê-se apertado como que dentro duma tenaz, tudo se me torna pesado, todas as minhas alegrias, que não me faltariam, dissipam: e com as apreensões do futuro... As minhas orações— já se deixa ver — são prejudicadas por mil distrações, e o mesmo acontece com a leitura espiritual e a meditação... A própria Comunhão, sabe Jesus com que fervor eu a faço... Fico como que suspensa, abstrata, inerte, indecisa, à maneira de quem, sentindo rumorejar-lhe sobre a cabeça uma tempestade ameaçadora, e não podendo fugir-lhe, fica para ali à espera que se rompam as nuvens, ribombe o trovão e fuzilem os raios.

Mas, afinal, o que é que me incute tão grande temor e tanto me conturba? Onde está essa fadiga e esse sacrifício? Não serão os mesmos que eu já suportei tantas vezes? Então, também me pareciam ao princípio uma montanha, mas, uma vez superados, vi que não passavam de uma névoa que em breve se dissipa. Depois, chamei-me a mim mesma uma louca por ter temido tanto e fiz o propósito de me corrigir de futuro... E agora faço o mesmo...

E quando soará a hora desse sacrifício?... Quando? Oh! Como eu sou pequenina de entendimento e mesquinha de coração! Deverão passar ainda muitos dias e semanas, e eu começo já a angustiar-me? Não seria melhor empregar este intervalo de tempo em premunir-me contra o meu receio presente e as dificuldades futuras por meio da oração, da meditação adaptadas ao meu caso, e com o exercício de um pouco mais de confiança em Jesus? Eu sei tudo isto, percebo tudo muito bem: mas é isto exatamente que eu me esqueço de fazer.

Pobre de mim! Sou feita mesmo assim... Mas sou assim também por culpa minha. Tenho Jesus todo à minha disposição, e não o procuro. Ele poderia, com um só movimento de graça, dar-me força e vontade de fazer cem vezes mais daquilo, que deverei fazer dentro em breve, e de que tanto me arreceio: e nem penso nesta graça, não a espero, não a procuro. Ah! Se eu tivesse um pouquinho, que fosse, de confiança em Jesus, não sentiria certas agitações e receios.

Ainda bem que este amor próprio, estas misérias internas não as digo a ninguém: de contrário, que diriam de mim certas pessoas que ainda me julgam alguma coisa? Se soubessem que me amedronto com tão pouco! Se suspeitassem que em certos momentos me sinto quase arrependida do estado que abracei, só porque me impõe certos sacrifícios! Que quase invejo os mundanos, porque vivem sem certos aborrecimentos!

O certo é que, seja qual for a disposição do meu coração, dentro em breve deverei absolutamente suportar aquela fadiga e fazer aquele sacrifício... Portanto? Portanto tenhamos juízo, e entendamo-nos com Jesus.

Eis-me aqui, ó Jesus, com a alma meio convulsionada: a razão sabe-la tu e tu somente lhe podes dar remédio. Tu deste aos mártires a força maravilhosa de suportar o cárcere, os flagelos, as carnificinas, e tudo eles sofreram alegremente, com o vulto sereno e a alegria no coração... Porque não me dás a mim também um pouco daquela força? Bem pouca me basta, porque entre mim e os mártires interpõe-se um abismo... E, tratando-se de tão pouco, não me lo darás?

Como! Ouso quase confrontar-me com os mártires?... Ó Jesus, tem compaixão da minha puerilidade... Eu não te peço graças extraordinárias... Contento-me com uma só, muito simples, de todos os dias... Com uma Comunhão bem feita! Ó Jesus, faze-me a graça de te receber bem hoje e sempre... Isso me basta: as fadigas, as violências, os sacrifícios já não me causarão medo; não, não me causarão mais medo.

Quando eu tiver Jesus em mim, terei aquela Carne que se afadigou e suou na oficina de Nazaré, que provou o cansaço das viagens e das vigílias, as prostrações e os esgotamentos do jejum e da fome, e o tormento da sede; terei em mim aquele Sangue que Ele sentiu referver-lhe nas veias perante a hipocrisia dos Fariseus, debaixo das calúnias de acusadores infames e juízes iníquos, e que soube temperar nos seus ardores com uma paciência divina, e derramar até a última gota sobre uma cruz infamante; terei em mim aquela Alma que, depois de ter passado pela via espinhosa e difícil das mais sublimes virtudes, agonizou, sem um só lamento, no Getsêmani, e expirou sobre a cruz, depois de ter dirigido ao Pai a última súplica de perdão pelos cruxifixores; terei em mim aquela Divindade... A Divindade de Jesus em mim?... E, compenetrada, investida, vivificada pela Divindade, terei eu ainda receio em sorver o amargo do fel do meu cálice? De suportar a convivência com aquela pessoa antipática, de renegar a minha vontade? De consumir um pouco das minhas forças no serviço de Deus e do próximo? De apanhar mesmo uma doença para cumprir o meu dever?... Mas não eram todas estas coisas, e outras mais graves ainda, que mantinham alegres os Santos? Não são todas estas coisas o fruto de uma comunhão bem feita?

Portanto, por que em vez de atender à força admirável que Jesus confere a quem confia n'Ele, atendo mais depressa às dificuldades que me esperam? Porque me aflijo e melancolizo sem razão e sem vantagem, em vez de preparar-me a fazer um pouco melhor as minhas comunhões?

Basta; se penso muito acabo por me envergonhar de mim mesma. É preciso tomar uma resolução, e a resolução é esta: 1.°, avivar a minha fé na Eucaristia, que é o pão dos fortes; 2.°, avivar a minha esperança em Jesus, que sempre ajuda quem n'Ele confia; 3.°, avivar a minha caridade,com o propósito de suportar alegremente por amor de Jesus qualquer fadiga ou sacrifício.

Ó Jesus, mil graças pela santa inspiração que me mandaste! Agora já não temo nada, e afrontarei tranquilamente o futuro, ciente de que, em qualquer trabalho que me sobrevenha, eu serei por ti confortada e repousarei sobre o teu Coração.

quarta-feira, 25 de setembro de 2019

CENTELHAS EUCARÍSTICAS: Recordações

CENTELHAS EUCARÍSTICAS

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XVIII
Recordações
__________


SE não tivesse mil razões para fazer companhia a Jesus, bastar-me-ia só esta — a das recordações que me desperta o lugar em que Ele está.

O templo... Quantas coisas me diz! Aqui vim eu em criancinha fazer a primeira comunhão... Como era boa naquele dia! Quanto me sentia feliz! Recordo quem me acompanhava, quem estava ao meu lado; parece-me ver aquelas almas boas... Para onde foram elas? Ah! Estão bem longe de mim! O campo santo arrebatou-as ao meu coração... Mas Jesus ninguém mo arrebatou: Ele está sempre aqui, no mesmo Tabernáculo de então, iluminado pela mesma luz, honrado com os mesmos cânticos... Nenhuma mudança se operou... Somente eu não sou tão boa como antes. Ah! Se eu pudesse reaver a inocência daquele dia!... Ó meu Jesus, Tu bem vês, dá-me vontade de chorar...

Não posso circunvagar os olhos por esta igreja, sem pensar... Sem recordar... Aqui vi eu durante longos anos tantas almas a tratar com Jesus os interesses eternos... E agora cederam-me o seu lugar. Elas oravam tão bem, e eu oro tão mal! Elas vinham aqui a... Fazer o quê? Que faziam elas à Mesa eucarística?... No Tribunal da penitência?... Assentadas ali naqueles bancos, durante as sagradas funções e as prédicas? Ah! Agora compreendo melhor que então: faziam-se santas. E eu, se tivesse herdado aquela piedade, quanto poderia aproveitar, estando aqui! Como saberiaorar com fervor! como saberia sofrer resignada! Como saberia sorrir olhando para o Céu... Em vez disso, Tu bem vês, ó Jesus, que eu façoaqui... perco o tempo em distrações.

Aqui tantas vezes ouvi entoar o Requiemou sobre um esquife ou sobre um cadafalso... Faziam-se as exéquias de gente conhecida e que eu amei... Orei um pouco por eles... Derramei também alguma lágrima... Ai de mim! As recordações confundem-se com as previsões... Também meu corpo será transportado aqui um dia... E Tu, ó Jesus, que coisa provarás no coração quando vires tua pobre criatura reduzida a um cadáver? Chorarás como choraste sobre tumba de Lázaro?... Sem dúvida também eu desejei ser-te sempre amiga... Caro Jesus! Se não na morte, ao menos no dia de Juízo, faze-me ouvir o Teu veni foras... Porque também nesse momento, e sobretudo então, eu desejarei abraçar-me ao Teu Coração e estar sempre contigo.

terça-feira, 24 de setembro de 2019

CENTELHAS EUCARÍSTICAS: Tenho medo

CENTELHAS EUCARÍSTICAS
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JESUS SACRAMENTADO
XVII
Tenho medo
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TENHO visto mais de um a morrer... Às vezes encontram-se motivos de consolação; mas quantas vezes o nosso espírito fica aterrado! Ao ver a resignação, que em muitos acompanha os espasmos da agonia, o coração enternece-se e sente-se inveja daqueles moribundos; ao assistir aos últimos arrancos da morte, sente-se o peito oprimido de terror. Como suportar sem um lamento e uma impaciência os tormentos da última hora?

Não se pode escapar aos horrores da morte: ou ser-se colhido de improviso — morte de que Deus nos defenda — ou morrer-se lentamente... E então quantos sofrimentos! Chega-se a um ponto em que não há um só membro que não sofra, em que da cabeça aos pés se é atormentado, como... Tantos e tantos que tenho visto.

Agora as minhas enfermidades são limitadas e posso suavizar-lhes a amargura de mil maneiras. Mas então já não haverá nenhum remédio, e todo o esforço dos médicos será dirigido a prolongar-me os martírios por mais algum tempo... Impedir-me-ão por algumas horas de morrer, mas não de sofrer. E eu que sinto tremer e gelar-se-me o coração ao ver os outros nas ânsias da morte, que será quando me vir eu mesma nos estertores da agonia? Quando sentir meus lábios secos e a língua enregelada? Quando com o peito oprimido me faltar a respiração? Quando os meus membros forem sacudidos pelas garras da morte? Quando... Ah! Que farei eu então?

Que sentirei no coração quando chegar a hora da Extrema-Unção? Quando começarem a recitar o ProficiscereQuando os entes caros, longe de me dizerem que hei de vencer a doença, começarem a infundir-me coragem e resignação, a falar-me nos gozos do Céu, no Paraíso?... Mas estas palavras, conquanto consoladoras, não serão para mim um puro e simples sinônimo de morrer?... E como estarei eu disposta a deixar tudo e partir para o mundo de além?

Se penso seriamente em todas estas coisas, sinto-me realmente apavorada. Contudo, ou amedrontada ou tranquila, a minha última hora chegará... E, então, quem me ajudará? Não é mister pensar muito para responder: o único que nesse momento me poderá prestar auxílio é Jesus. Se Ele me falta, falta-me tudo, e eu ficarei só com as minhas dores e os meus receios.

Mas Jesus não me faltará... Tenho visto que nunca faltou a ninguém. Ao contrário, tem-se aproximado daqueles que sempre o têm odiado, com a esperança de os salvar. E não o terei eu, então, junto de mim, tendo-lhe sempre querido tanto bem? E, tendo então perto de mim o meu Jesus, poderão as minhas últimas horas ser assim tão más? Espero que não.

Terei, portanto, pungentes dores por todo o meu corpo; mas Jesus se mostrará à minha fé, ou preso à coluna e flagelado, ou pendente do madeiro da Cruz, e me dará um pouco daquela resignação, que tinha Ele mesmo entre tão cruciantes tormentos. Sentirei angústias no coração e a vista da eternidade me causará um terror pânico, mas Jesus saberá dizer-me alguma daquelas palavras, que fazem sorrir os moribundos e lhes arrancam lágrimas de consolação. Experimentarei talvez certos temores, mas Jesus que tem acalmado tantos, acalmará também os meus.

Afinal, eu pergunto a mim mesma: é possível que Jesus me abandone, quando eu estiver para morrer, tendo-lhe eu sempre pedido a graça de expirar entre os seus braços, e tendo experimentado tantas vezes na vida as doçuras da sua caridade? Ter-me-á concedido todas estas doçuras para me enganar? Oh! Não! O dizê-lo seria uma blasfêmia, e eu nem mesmo o quero pensar...

É possível, pois, que Jesus me abandone e me deixe só a lutar com os tormentos da morte? Ó Jesus, com o Coração que tens será isto possível? É possível que esteja eu a sofrer e o Teu Coração fique insensível no Tabernáculo e não corra a confortar-me?... Todos os dias a Comunhão, e na hora da morte a separação... Será possível, ó Jesus? Agora tantas esperanças e depois um enorme desengano... Será possível, ó Jesus? Agora dizer cem e mil vezes ao dia meu Jesuse dever então concluir que tu já não serás meu... Ó Jesus, será possível?

Eu não arredarei um só passo do caminho da minha esperança. Crerei sempre, esperarei sempre, e direi sempre que jamais serei abandonada por ti, nem agora, nem depois. Desde já considero como feita essa graça de ser ajudada por ti em todas as minhas necessidades, de ser assistida pessoalmente por ti, de exalar o último suspiro sobre teu Coração e de morrer, como tenho visto tantos outros... Com o teu nome sobre os meus lábios, com o teu amor dentro do meu coração, com o teu Paraíso seguro entre as minhas mãos.

segunda-feira, 23 de setembro de 2019

CENTELHAS EUCARÍSTICAS: O Coração de Jesus

CENTELHAS EUCARÍSTICAS
 PEQUENA COLEÇÃO
DE
Pensamentos e afetos devotos
a
JESUS SACRAMENTADO

XVI
O Coração de Jesus
__________

TODAS as almas cristãs o conhecem... Ao menos de nome; mas quantas o conhecem como ele é em si mesmo? Se fosse bem conhecido, seria mais vivo e potente, e desapareceriam de vez certos receios que, de cristãos, só têm uma leve aparência.

Jesus, ao apresentá-lo à Beata Margarida, disse estas palavras: — «eis o Coração que tanto amou os homens.» — Palavras que deviam ser recordadas por todos, quando se lê o Evangelho, quando se meditam os novíssimos, quando se teme a justiça divina, sempre e em toda a parte.

Portanto, se por desgraça uma alma caiu numa culpa grave, não tarde em recorrer ao tribunal da penitência, mas pensando sempre naquele Coração, que tanto ama os homens.

Se uma alma fica aterrada com a idéia de apresentar-se ao tribunal divino e quase desespera de ter uma sentença de misericórdia, pense que Cristo Juiz tem um Coração, que ama tanto os homens.

Se te assalta o temor de ter uma morte improvisa, pensa que o Coração de Jesus ama tanto os homens.

Se te vêem à memória as ingratidões com que ultrajaste a bondade divina, recorda também que o Coração de Jesus ama tanto os homens.

Se nos assalta a desconfiança na misericórdia de Deus e na sua graça, e a conversão e perseverança no bem nos parece impossível, lembremo-nos que o Coração de Jesus ama tanto os homens.

Se... Mas basta. A devoção ao Coração de Jesus não deve consistir somente em recitar coroinhas em sua honra, mas também e sobretudo em crer no seu infinito amor pelos homens. Oh! Se a alma cristã se dispusesse todos os dias a meditar, durante meia hora, esta verdade — oCoração de Jesus ama-me tanto... Tanto — como desapareceriam certos receios absurdos e enervantes... Quantos e novos arrebatamentos não os substituiriam... Como se caminharia pela estrada da virtude a passos de gigante!

Assim como qualquer ensinamento contra o Evangelho deve repudiar-se como uma heresia, assim também toda a máxima, todo o pensamento, toda a doutrina que se oponha às palavras de Jesus — eis o Coração que tanto tem amado os homens — deve condenar-se como ruinosa à piedade crista.

Não é impunemente que os jansenistas, velhos e novos, fizeram e fazem uma guerra surda e implacável à devoção do Sagrado Coração; bem sabem os infelizes que, uma vez conhecido o Coração de Jesus, é impossível não amá-lo, e amando o é impossível não se salvar.

domingo, 22 de setembro de 2019

CENTELHAS EUCARÍSTICAS: Alma distraída

CENTELHAS EUCARÍSTICAS
 PEQUENA COLEÇÃO
DE
Pensamentos e afetos devotos
a
JESUS SACRAMENTADO

XV
Alma distraída
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QUANDO oro, desejaria estar toda recolhida em Jesus, como que encarcerada no Tabernáculo e encadeada à píxide... Mas, ao contrário, sou flagelada pelas distrações contínuas, e não consigo estar atenta um minuto sequer.

Como seria belo ter a mente toda ocupada em Jesus, a imaginaçãotoda impregnada de Jesus, o coração todo palpitante por Jesus, a almatoda absorvida em Jesus! Seria belo, mas essa beleza não é para mim.

Mas, porque é que todos os outros estão recolhidos e só eu estou distraída? Não será isto um castigo pelas distrações voluntárias doutros tempos? Não me admiraria de que assim fosse. O certo é que dantes não fazia nenhum esforço para estar recolhida, e passava todo o tempo da oração a fantasiar, a correr com o pensamento atrás de mil bagatelas e até mundanidades; assim a Missa, as prédicas, as meditações, as leituras passavam... Isto é, Jesus passava-me vizinho, muito vizinho, e eu não o via; Jesus falava-me, e eu não lhe dava ouvidos; Jesus mostrava-me o Coração transbordante de amor e de graças e eu tudo desprezava... Agora, que eu o procuro, é que não o encontro nunca.

Creio, realmente, que as presentes distrações são um castigo das distrações passadas. Jesus está perto de mim, eu avizinho-me d'Ele, Ele escuta-me, porque vê em mim a boa vontade de falar-lhe... Mas a doce satisfação de deixar-me gozar da sua presença, essa não ma dá.

Talvez as minhas orações atuais sejam mais meritórias, porque as faço com dificuldade e sem gosto, mas o fato é que são para mim uma verdadeira penitência. Ah! Como é doloroso falar a Jesus e não o ouvir responder! Saber que Ele me quer bem e não ouvir uma palavra de amor! Esforçar-me por lhe falar só a Ele, e enquanto falo não ver com o pensamento senão criaturas banais, ordinárias e até mal comportadas!

Ah! Se quando eu era jovem me tivesse habituado a refrear um pouco a fantasia! Se tivesse feito melhor a meditação! Se tivesse tomado a peito as coisas da alma e da eternidade!... Que doçura não sentiria agora quando me encontro ao pé de Jesus... Como iriam bem as minhas orações!

Mas, paciência! Fiz o mal, agora faço penitência. Mas, lembra-te bem, ó minha alma, que esta penitência consiste exatamente em continuar a orar mesmo com distrações, sem perder a coragem e sem ter jamais uma só gota de doçura. Ainda mais: deves persuadir-te de que, quando fazes o possível por estar recolhida, quanto mais a tua oração é árida e distraída, tanto mais cara é a Jesus e meritória; e se te não proporciona consolações no tempo, prepara-tas para a eternidade.

Portanto, tomarei a cruz como Deus quer que a tome, e orarei... Como posso e não como quero. As minhas intenções sabe-as Jesus, e vê também os meus desejos. Ponho tudo em suas mãos.

Pensando bem, até nisto se mostra um pouco a misericórdia de Jesus. Nas condições em que me encontro, não poderia fazer grandes penitências materiais... E os meus débitos com Deus são certamente gravíssimos. Portanto é para mim uma grande graça poder fazer uma penitência conciliável com a minha pouca saúde e as minhas ocupações, uma penitencia de todos os lugares, de todas as horas, ignorada de todos... De manhã volverei o meu olhar para Jesus, oferecendo-lhe o meu coração, todas as ações do dia, pedindo-lhe que me abençoe; e Jesus escondido e mudo... Que penitência! Durante o dia, à Missa, à comunhão, à visita e em muitas outras circunstâncias lhe confiarei as minhas grandes necessidades; e Jesus continuará a estar escondido e mudo... Que penitência! À noite, faminta de conforto, depois das minhas fadigas, e talvez depois de muitas amarguras, eu orarei... Isto é, esforçar-me-ei por orar com recolhimento e fervor, sem o conseguir; e Jesus sempre, como antes, escondido e mudo! Que penitência!

Ó caro Jesus! Vê-se bem que, sobre este ponto, não queres ceder,me condenas a sofrer na ocasião em que eu mais esperava ser confortada... Paciência! Mas recorda o que tantas vezes tens prometido — que a penitência é a moeda mais preciosa para comprar o Paraíso...

Portanto, ó Jesus, com as minhas involuntárias distrações eu compro o Paraíso; e tu me darás esse Paraíso depois da morte, exatamente porque durante a vida fui involuntariamente distraída... Vai bem assim?

Jesus eu Vos amo em todos os Sacrários da terra, vinde ao meu coração, vinde vivei em mim e transformai-me!